Enquanto isso, no Brasil, as condições socioculturais e econômicas que
levam ao envelhecimento populacional ocorreram de maneira concomitante
e são observadas desde os anos 1960. Nessa década, começou o processo de
industrialização da economia, que atraiu trabalhadores para as cidades.
Somam-se a isso a melhora nas condições de nutrição e saneamento básico
e a ampliação do acesso a serviços de saúde e medicamentos.
Isso acarretou uma mudança nas causas de morte: doenças relacionadas ao
envelhecimento, como câncer, doenças cardiorrespiratórias e crônicas,
passaram a ser as maiores causas de óbito, ultrapassando as mortes por
doenças infecciosas, respiratórias e parasitárias. Desse modo, a taxa de
mortalidade geral caiu pela metade em apenas 20 anos: foi de 20,9 óbitos
por mil habitantes, em 1940, para 9,8 em 1960. Em 2015, ela ficou em 6,08.
Já a expectativa de vida, que era de 45,5 anos em 1940, chegou a 75,5 em
2022 para ambos os sexos.
As campanhas de vacinação em massa, programas de pré-natal e
aleitamento materno, por sua vez, corroboraram com a redução da
mortalidade infantil. O índice de óbitos de crianças até um ano era de 146
mortes para cada mil nascidas vivas em 1940. Em 2015, o indicador de era
de 14 para cada mil. Em 2021, foi de 11,2.
Outro fator que impulsionou o envelhecimento populacional foi a queda na
fecundidade, que o IBGE atribuiu à maior escolarização das mulheres.
Desde os anos 1960, o acesso à educação foi ampliado com a massificação
do ensino universitário. Além disso, houve a disseminação de métodos
anticoncepcionais, como a pílula, e as mulheres passaram a adiar a
maternidade.
A fecundidade no Brasil passou de 6,28 filhos por mulher, em 1960, para
1,9 filho por mulher em 2010, e 1,76 em 2021. Em 50 anos, a queda dessa
taxa foi de 70%, segundo o IBGE.
"Há uma mudança de mentalidade em relação a quantos filhos se quer ter.
Havia um ideal de família numerosa, agrária na década de 1950, em que era
preciso ter muitos filhos para ajudar na lida. Com a maior urbanização, esse
modelo de família grande já não cabe mais", diz a professora de demografia
da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Luciana Lima.
Preparação para a mudança
A Europa passou por uma série de mudança ao longo de mais de 200 anos
de envelhecimento populacional e, nesse longo período, fortaleceu o
sistema de bem-estar social, alcançou a estabilidade econômica e até
democrática. "A questão é que se estamos vivendo um processo mais
acelerado e não o equacionamos do ponto de vista social, teremos um
problema que pode chegar mais rápido, já que o Brasil tem uma população
altamente numerosa e uma grande quantidade de pessoas vulneráveis
socialmente", pondera Lima.
Ela argumenta que as políticas públicas devem se debruçar sobre demandas
relacionadas à promoção da saúde (atendimentos pelo SUS e cuidados em
casa) e assistência social. Também serão necessárias adaptações no
transporte urbano, de modo que seja mais acessível aos idosos, assim como
as condições de habitação e opções de lazer, por exemplo.
Esse cenário de menos nascimentos e mais longevidade tem outro efeito
numérico: a redução na força de trabalho. Por isso, alguns países adotam
medidas para aumentar a natalidade e recompor a População
Economicamente Ativa (PEA), tendo em vista que esta chegou a 63,9% na
União Europeia.
No caso da Alemanha, há incentivos financeiros como a possibilidade de
dividir o período de licença entre os pais e o chamado Elterngeld (dinheiro
dos pais), uma compensação à perda financeira de quem deixa de trabalhar
ou reduz a carga horária para cuidar dos filhos. Há ainda políticas de
migração, mas estrangeiros têm sido alvo de racismo nos países europeus.
Sustentar a previdência
O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) estima que o total de
habitantes no Brasil deve encolher a partir de 2050 e chegar aos 177,9
milhões. Desses, 29,5% serão idosos com 65 anos ou mais. Os jovens até 14
anos devem somar apenas 13,5% da população, e a PEA, de 15 a 64 anos,
poderá representar 57%. Em 2022, a PEA foi de 69,3% da população. Essa
proporção da população impõe desafios aos governos para financiar o
sistema de seguridade social.
"O Brasil tem se preparado, mas ainda precisa fazer muito. O país poderia
ter feito muito mais investimentos nas juventudes para aproveitar de melhor
forma a janela de oportunidade, quando o contingente de população jovem
é o maior entre os grupos populacionais. Estou falando de educação,
oportunidade de geração de emprego e renda, mais a oportunidade de ficar
vivo também", diz Junia Quiroga, representante do Fundo de População das
Nações Unidas no Brasil (UNFPA).
Lima concorda. "Quanto mais essas pessoas estiverem inseridas no mercado
de trabalho e contribuindo para a Previdência, melhor para o sistema",
acrescenta. Uma das estratégias é direcionar investimentos para educação e
aumento da produtividade, uma vez que, com menos jovens, a demanda por
vagas em escolas será menor e os investimentos podem se voltar à
qualidade do ensino. "É preciso pensar hoje em um futuro em que os idosos
serão a maioria. Envelhecer é um direito e um processo natural da vida".