AP (Fran) - A Abordagem Centrada na Pessoa e seus Princípios

  1. Compreensão Empática

É a capacidade do psicoterapeuta em se colocar no lugar do outro sempre, olhando a pessoa através do seu olhar, buscando se aproximar ao máximo da forma como a pessoa enxerga ou se sente a partir do seu contexto, sem, no entanto, sentir-se o outro.

É um "como se" sem ser, ou seja, dentro da visão da Abordagem Centrada na Pessoa, 'é de fundamental importância que o psicoterapeuta tenha a capacidade verdadeira de se colocar na pele do outro.

"Estar com o outro desta maneira significa deixar de lado, neste momento, nossos próprios pontos de vista e valores, para entrar no mundo do outro sem preconceitos. Num certo sentido, significa por de lado nosso próprio eu, o que pode ser feito apenas por uma pessoa que esteja suficientemente segura que não se perderá no mundo possivelmente estranho ou bizarro do outro e que poderá voltar sem dificuldades ao seu próprio mundo quando assim desejar" (ROGERS, 1977).

Quando falamos de Abordagem Centrada na Pessoa, estamos falando de uma relação verdadeira entre duas pessoas, e se eu apenas "simulo" essa compreensão, essa relação verdadeira se perde, tornando-se algo meramente técnico.

Ao mesmo tempo em que é imprescindível a capacidade dessa compreensão empática por parte do psicoterapeuta, entendo que por ser uma relação, quando estamos sintonizados de fato com a pessoa do cliente, essa compreensão torna-se algo natural e de mão dupla, ou seja, não há mais apenas uma compreensão empática por parte do psicoterapeuta, há algo muito maior, uma facilitação na compreensão do fenómeno da empatia. A capacidade de haver de fato um encontro, uma ligação de sentimentos entre psicoterapeuta e cliente.

A compreensão empática, em outras palavras, é um estado de consciência no qual uma pessoa experiencia e participa de um fluxo de pensamentos e sentimentos e seus significados com outra pessoa, enquanto ao mesmo tempo também está consciente do conceito maior dentro do qual os dois existem (WOOD, 1994).

Mais do que estar aberto à experiência do outro, a compreensão empática significa estar aberto a essa experiência junto com o outro, fazendo parte do mundo do outro, caminhando passos do outro, estando conectado a esse mundo de forma natural, verdadeira e intensa.

Acredito que a compreensão empática, quando existente na relação de ajuda, seja algo curador, revolucionário. Sentir-se compreendido é, de alguma forma, perceber-se vivo no mais amplo sentido da palavra. É sentir que há ressonância naquilo que se exprime e que há alguém que naquele momento está junto. É a possibilidade de sentir-se acompanhado em seus sentimentos e verdades muitas vezes escondidas em função de medos, angústias e padrões condenados por si mesmo ou pelo mundo exterior.

Sendo ouvida e verdadeiramente compreendida, talvez a pessoa também se ouça e se compreenda e, nesse instante, muitas coisas estarão acontecendo com ela em seu processo de crescimento e é isto o que importa.

  1. Congruência

Descobriu-se que a transformação pessoal é facilitada quando o psicoterapeuta é aquilo que é, quando as suas relações com o cliente são autênticas e sem máscaras nem fachada, exprimindo abertamente os sentimentos e as atitudes que nesse momento ocorrem. Utilizamos o termo congruência para tentar descrever essa condição. Com esse termo, procura-se significar que os sentimentos que o terapeuta estiver experienciando são válidos para ele, válidos para a sua consciência e ele pode Viver esses sentimentos, assumi-los e pode comunicá-los, se for o caso. Ninguém realiza plenamente essa condição e, portanto, quanto mais o terapeuta souber ouvir e aceitar o que se passa em si mesmo, quanto mais ele for capaz de assumir a complexidade dos seus sentimentos, sem receio, maior será o seu grau de congruência (ROGERS, 1961).

Congruência significa a capacidade do psicoterapeuta em ser autêntico em relação aos seus sentimentos no que diz respeito à pessoa que está buscando ajuda.

Em uma relação de ajuda, onde a base é a confiança e a verdade, em minha opinião, não ajuda esconder do cliente sentimentos que estejam emergindo no psicoterapeuta a respeito da pessoa do cliente. É importante que o psicoterapeuta diga o que sente, deixando claro, no entanto, que esta é apenas a sua percepção e não a verdade absoluta ou uma verdade inconsciente do outro.

Rogers dizia que quando sentia algo apenas por um instante, não se preocupava em tentar guardar ou lembrar, mas que se esse sentimento fosse persistente ele não hesitava em compartilhar com o seu cliente.

Congruência significa a capacidade do psicoterapeuta em ser genuíno com a pessoa do cliente, levando em conta os seus sentimentos e suas percepções para que ele possa tentar contribuir com uma possível reflexão do cliente a respeito de sim mesmo para quem sabe colaborar com o crescimento da pessoa . Serve também para que o profissional possa se esvaziar desses sentimentos para conseguir voltar a estar atento de forma inteira nessa relação.

Ser genuíno tem a ver com honestidade e pureza. Junte-os. Um sentimento puro é percebido em meio à complexidade de sensações que constituem uma consciência e é expresso de modo direto e honesto, sem autocensura, mas ainda assim de maneira apropriada: congruência. Pode parecer simples, mas não é sempre tão óbvio quanto se manifesta. Facilitações de encontros em pequenos grupos são particularmente susceptíveis a confusão entre congruência e impulsividade
(WOOD, 1994).

  1. Consideração Incondicional Positiva

Consideração incondicional positiva nada mais é do que a tentativa de resgatarmos em nós, psicoterapeutas, essa capacidade de considerar o outro, de aceitá-lo dentro dos seus sentimentos, pensamentos e atitudes, independente de quais sejam

Aceitar o outro não significa concordar

Aceitar o outro incondicionalmente, para mim, é termos a capacidade de 80 enxergarmos essa pessoa como única, é ter a certeza de que as verdades são relativas e que as minhas verdades servem apenas a mim. É ter a convicção que não me serve, na relação de ajuda, acreditar nos padrões sociais ou morais como verdades universais. É ter a capacidade de crer no outro ainda que ninguém creia. É ter a confiança nessa pessoa que busca ajuda, ainda que ninguém confie. É ter a chance de me despir dos meus conceitos e preconceitos para estar com ela.

A experiência é, para mim, a suprema autoridade. A minha própria experiência é a pedra de toque de toda validade. Nenhuma ideia de qualquer pessoa, nem nenhuma de minhas próprias ideias, tem a autoridade que reveste a minha experiência. É sempre a experiência que eu regresso, para me aproximar cada vez da verdade, no processo de descobri-la em mim. Nem a bíblia, nem os profetas — nem Freud, nem a investigação — nem as revelações de Deus ou dos homens — podem ganhar precedência relativamente a minha própria experiência direta (ROGERS, 1961).

A atitude de consideração positiva incondicional do terapeuta para com o cliente poderá resgatar sua autoestima e, posteriormente, reavivar o exercício de sua liberdade experiencial tão massacrada ou postulada por diversos valores externos a si mesmo. O exercício dessa liberdade na relação terapeuta-cliente tende, também, a restabelecer a adequação de seu contato com o mundo externo, no sentido da re-atualização de sua experiência interna. Através da consideração positiva do terapeuta, o cliente começa a ter consideração para consigo mesmo, voltando a ter fé no seu processo, movido pela energia de sua própria vivência experiencial (JORDÃO, 1987).

  1. Algumas Considerações Importantes

A Abordagem Centrada na Pessoa não se dispõe a ser a verdade absoluta. Rogers, precursor dessa abordagem, sempre teve o cuidado de exprimir as suas ideias como hipóteses de trabalho (ROGERS, 1961), tendo grande receio de que os seus pressupostos se tornassem dogmas.

Os princípios facilitadores propostos pela Abordagem Centrada na Pessoa se complementam!

  1. Alguns psicoterapeutas levantam a seguinte questão: e se eu não for capaz de aceitar o outro incondicionalmente?

Conforta-me saber que, apesar do meu esforço e da minha intenção em ajudar a pessoa, eu, na condição de ser humano, posso não dar conta de aceitar alguém como gostaria.

Eu realmente gostaria de poder aceitar sempre as pessoas de forma incondicional, mas me sinto confortável em saber que posso falar o que realmente sinto se não conseguir aceitá-la.

Ser apenas congruente talvez me fizesse expressar isto de forma descuidada. Ser congruente, de forma empática, me dá a possibilidade de, ainda que eu não consiga aceitar a pessoa de um jeito incondicional, eu tenha condições de expressar isto de forma cuidadosa, pois se de fato for empático, o fato de me colocar na pele dessa pessoa me dará condições de expressar o meu sentimento de forma clara, porém cuidadosa.

Nesse caso, a congruência me auxilia, pois não tenho dúvidas de que a capacidade de poder me expressar de forma genuína é facilitador em mim e no cliente, embora muitas vezes isto possa gerar algum desconforto em âmbos.

  1. Outra questão que por vezes me perguntam é se tenho a obrigação de ser congruente sempre

É claro que eu gostaria de ter essa capacidade o tempo todo, pois, como disse anteriormente, tenho convicção que ser genuíno em uma relação é altamente facilitador.

Para estar centrado no outro, é importante que eu esteja centrado em mim também. Penso que seja impossível eu ter respeito verdadeiro com o outro se não tiver esse mesmo respeito comigo.

Como é possível aceitar as dificuldades do outro se não consigo me aceitar em minhas dificuldades e limitações? Como é possível me colocar na pele do outro se não sou capaz de me ver em minha própria pele? Como posso ser genuíno com o outro se não sou honesto comigo mesmo? Como posso acolher a pessoa se me violento?

Não "atuo" como psicoterapeuta. "Sou"! Não visto uma roupa de psicoterapeuta. Não utilizo os princípios da Abordagem Centrada na Pessoa como técnica. Sinto estes princípios em mim. Este é o meu jeito ser.

Rogers mesmo desculpou-se algumas vezes por ter usado a expressão "não diretivo", embora não tenha a certeza de ter sido ele o seu criador, tendo abandonado a expressão não diretivo já no início da década de 60, em função da confusão e de seu mau uso por parte dos profissionais que tinham essa abordagem como referencial teórico.

Ser um psicoterapeuta centrado na pessoa, em minha opinião, significa ser livre, respeitando o jeito de ser do cliente, mas respeitando também o seu próprio jeito de ser. Significa confiar no potencial do cliente, mas também confiar no seu próprio potencial e na própria capacidade em estar presente de forma inteira e intensa nessa relação.