**Em consequência, ainda que se considerem bens públicos, nenhum ente público exerce sobre estas terras uma posse. A posse, como se sabe, constitui um poder fático que se exerce sobre a coisa, correspondente ao poder de se sentar sobre o objeto possuído (o vocábulo bem do latim post sedere = poder sentar). Ora, sequer se sabe exatamente quais são essas terras, que se encontram dispersas e desprovidas de registro. Na verdade, do ponto de vista jurídico, elas constituem quase uma ficção, dada a existência de mera suposição de que são devolutas. Logo, deve-se concluir que, para serem consideradas bens públicos e se invocar esta condição como obstáculo à aquisição por usucapião, devem ser objeto de um processo de discriminação, na forma estabelecida mais recentemente pela Lei nº 6.383/76. [...] Não se pode conceber, em face da exigência constitucional de que a propriedade tenha que cumprir a função social (art. 5º, XXIIII), que o Estado proíba que se adquiram terras devolutas - que sequer sabe quais sejam - por quem as tornou produtivas e nelas fixou moradia, sem desatender o interesse público. Não me parece razoável, por fim, que o Estado possa exigir dos outros exatamente aquilo que proíbe contra si mesmo.
(DANTAS, Francisco Wildo Lacerda. A reforma agrária e a usucapião pro labore. Revista de Informação Legislativa. n. 131. Brasília: Senado Federal, 1996. p. 259.)**