SÍNDROME DE GUILLAIN-BARRÉ

A Síndrome de Guillain-Barré (SGB é a maior causa de paralisia flácida generalizada no mundo, com incidência anual de 1–4 casos por 100.000 habitantes e pico entre 20 e 40 anos de idade. Inexistem dados epidemiológicos específicos para o Brasil, apenas a distribuição dos subtipos da doença. A SGB é uma doença de caráter autoimune que acomete primordialmente a mielina da porção proximal dos nervos periféricos de forma aguda ou subaguda. Aproximadamente 60% a 70% dos pacientes com SGB apresentam alguma doença aguda precedente (1 a 3 semanas antes), sendo a infecção por Campilobacter jejuni a mais frequente (32%), seguida por citomegalovírus (13%), vírus Epstein Barr (10%) e outras infecções virais, tais como hepatite por vírus tipo A, B e C, influenza e vírus da imunodeficiência humana (HIV). Outros fatores precipitantes de menor importância são intervenção cirúrgica, imunização e gravidez. A maioria dos pacientes percebe inicialmente a doença pela sensação de parestesia nas extremidades distais dos membros inferiores e, em seguida, superiores. Dor neuropática lombar ou nas pernas pode ser vista em pelo menos 50% dos casos. A intensidade pode variar desde fraqueza leve, que sequer motiva a busca por atendimento médico na atenção básica, até ocorrência de tetraplegia completa com necessidade de ventilação mecânica por paralisia de musculatura respiratória acessória. Fraqueza facial ocorre na metade dos casos ao longo do curso da doença. Entre 5%-15% dos pacientes desenvolvem paresia oftálmica e ptose. A função esfincteriana é, na maioria das vezes, preservada, enquanto a perda dos reflexos miotáticos pode preceder os sintomas sensitivos até mesmo em músculos pouco afetados. Instabilidade autonômica é um achado comum, causando eventualmente arritmias relevantes, mas que raramente persistem após duas semanas. A doença usualmente progride por 2 a 4 semanas. Progressão de sinais e sintomas por mais de 8 semanas exclui o diagnóstico de SGB, sugerindo, então, polineuropatia desmielinizante inflamatória crônica (PDIC). Passada a fase da progressão, a SGB entra num platô por vários dias ou semanas, com subsequente recuperação gradual da função motora ao longo de vários meses. Entretanto, apenas 15% dos pacientes ficarão sem nenhum déficit residual após dois anos do início da doença, e 5% a 10% permanecerão com sintomas motores ou sensitivos incapacitantes. A mortalidade nos pacientes com SGB é de aproximadamente 5% a 7%, geralmente resultante de insuficiência respiratória, pneumonia aspirativa, embolia pulmonar, arritmias cardíacas e sepse hospitalar. Os fatores de risco para um mau prognóstico funcional são idade acima dos 50 anos, diarreia precedente, início abrupto de fraqueza grave (menos de 7 dias), necessidade de ventilação mecânica e amplitude do potencial da condução neural motora menor que 20% do limite normal. O prognóstico motor é melhor nas crianças, pois necessitam menos de suporte ventilatório e recuperam-se com maior rapidez. Recorrência do episódio pode ocorrer em até 3% dos casos, não havendo relação com a forma de tratamento utilizada na fase aguda, conforme se acreditava.

DIAGNÓSTICO

DIAGNÓSTICO CLÍNICO

O diagnóstico da SGB é primariamente clínico. No entanto, exames complementares são necessários para confirmar a hipótese diagnóstica e excluir outras causas de paraparesia flácida. Os pacientes com SGB devem obrigatoriamente apresentar graus inequívocos de fraqueza em mais de um segmento apendicular de forma simétrica, incluindo musculatura craniana. Os reflexos miotáticos distais não podem estar normais. A progressão dos sinais e sintomas é de suma importância, não podendo ultrapassar 8 semanas e com recuperação 2-4 semanas após fase de platô. Febre e disfunção sensitiva são achados pouco frequentes, devendo levantar suspeita de uma etiologia alternativa, de causa provavelmente infecciosa.

DIAGNÓSTICO LABORATORIAL

Análise do líquido cefalorraquidiano (líquor): Elevação da proteína no líquor acompanhada por poucas células mononucleares é o achado laboratorial característico, evidente em até 80% dos pacientes após a segunda semana. Entretanto, na primeira semana, a proteína no líquor pode ser normal em até 1/3 dos pacientes. Caso o número de linfócitos no líquor exceda 10 células/mm3, deve-se suspeitar de outras causas de polineuropatia, tais como sarcoidose, doença de Lyme ou infecção pelo HIV.

DIAGNÓSTICO ELETROFISIOLÓGICO:

A SGB é um processo dinâmico com taxa de progressão variável. O ideal seria reexaminar o paciente após a primeira semana do início dos sintomas, quando as alterações eletrofisiológicas são mais evidentes e mais bem estabelecidas. É importante salientar que a ausência de achados eletrofisiológicos dentro desse período não exclui a hipótese de SGB.

CRITÉRIOS DIAGNÓSTICO EXISTEM VÁRIOS CRITÉRIOS PROPOSTOS PARA A DEFINIÇÃO DO DIAGNÓSTICO DE SGB, SENDO EXIGIDOS TODOS OS ESPECIFICADOS ABAIXO:

• Presença de dois critérios essenciais (conforme a seguir);
• Presença de pelo menos três critérios clínicos sugestivos (conforme a seguir);
• Ausência de mais de uma situação que reduza a possibilidade de SGB;
• Ausência de situação que exclua o diagnóstico de SGB; e
• Análise do líquor e estudo neurofisiológico compatíveis com a doença e investigação adicional criteriosa com intuito de afastar outras etiologias. Nessas situações, deve ser avaliado por consultor médico especialista em doenças neuromusculares. A seguir estão indicados os critérios essenciais que sugerem, reduzem ou excluem o diagnóstico da SGB, bem como uma escala de gravidade da SGB.

CRITÉRIOS ESSENCIAIS PARA O DIAGNÓSTICO DA SGB

• Fraqueza progressiva de mais de um membro ou de músculos cranianos de graus variáveis, desde paresia leve até plegia.


• Hiporreflexia e arreflexia distal com graus variáveis de hiporreflexia proximal.

CRITÉRIOS DIAGNÓSTICO

CLÍNICOS: • Progressão dos sintomas ao longo de 4 semanas. • Demonstração de relativa simetria da paresia de membros. • Sinais sensitivos leves a moderados. • Envolvimentos de nervos cranianos, especialmente fraqueza bilateral dos músculos faciais. • Dor. • Disfunção autonômica. • Ausência de febre no início do quadro.

ESTUDO ELETROFISIOLÓGICO TÍPICO: São necessários três dos quatro critérios abaixo (geralmente ausentes antes de 5-7 dias, podendo não revelar anormalidades em até 15%-20% dos casos após esse período). • Redução da velocidade de condução motora em dois ou mais nervos. • Bloqueio de condução do potencial na condução neural motora ou dispersão temporal anormal em um ou mais nervos. • Prolongamento da latência motora distal em dois ou mais nervos. • Prolongamento de latência da Onda-F ou ausência dessa onda.

ANÁLISE DO LÍQUOR: • Alta concentração de proteína. • Presença de menos de 10 células/mm3.

CRITÉRIOS QUE REDUZEM A POSSIBILIDADE DA SGB

• Fraqueza assimétrica. • Disfunção intestinal e de bexiga no início do quadro. • Ausência de resolução de sintomas intestinais ou urinários. • Presença de mais de 50 células/mm3 na análise do líquor. • Presença de células polimorfonucleares no líquor. • Nível sensitivo bem demarcado.

CRITÉRIOS QUE EXCLUEM A POSSIBILIDADE DA SGB

• História de exposição a hexacarbono, presente em solventes, tintas, pesticidas ou metais pesados. • Achados sugestivos de metabolismo anormal da porfirina. • História recente de difteria. • Suspeita clínica de intoxicação por chumbo (ou outros metais pesados). • Síndrome sensitiva pura (ausência de sinais motores). • Diagnóstico de botulismo, miastenia gravis, poliomielite, neuropatia tóxica ou paralisia conversiva.

TRATAMENTO

Existem dois tipos de tratamento na SGB:


(1) a antecipação e o controle das comorbidades associadas;


(2) tratamento da progressão dos sinais e sintomas visando a um menor tempo de recuperação e minimização de déficits motores.


Não há necessidade de tratamento de manutenção, fora da fase aguda da doença. Assim, pacientes com SGB necessitam ser inicialmente admitidos no hospital para observação rigorosa.


A fisioterapia motora deve ser iniciada nesta fase com o intuito de auxiliar na mobilização precoce.


A gravidade clínica proposta por Hughes et al., sendo considerada:


  • doença leve de 0 a 2 e


  • moderado-grave de 3 a 6:


    é útil para a indicação de imunoglobulina ou plasmaférese – indicada quando a escala ser ≥3.

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Tabela ESCALA DE GRAVIDADE CLÍNICA PROPOSTA POR HUGHES ET AL pag 768 LEN.

• Imunoglobulina humana: : 0,4 g/kg/dia, por via intravenosa.


• Plasmaférese Não há indicação de glicocorticoides no tratamento da SGB.


Os pacientes devem ser reavaliados uma semana e um ano após a administração do tratamento, utilizando-se a Escala de gravidade clínica na SGB.