Eu escrevi um textinho, porque se eu tentasse explicar isso oralmente, não conseguiria. Então, eu preferi escrever, e vou lê-lo, e depois eu passo o texto para vocês:
“Para ler o Capítulo I do Livro III da Suma contra os Gentios, é preciso colocar-nos, mentalmente, no nível de abstração e universalidade requerido pelo assunto. Sto. Tomás aí trata da origem primeira de tudo o que existe. Não se trata, portanto, de imaginar uma “força” que aja de algum modo sobre as “coisas”, pois isso não só pressupõe a existência anterior de coisas, mas define o agente, de modo errôneo, por uma noção transitiva, a de “força”, quando é claro que a ideia mesma de um movimento transitivo exige algo em direção ao qual se transita”. (...)
Olavo: Mas Deus não tinha direção para a qual transitar.
“Trata-se, isto sim, de compreender que, se “existência” é o estado daquilo que existe, ela própria não pode existir nesse sentido, pois então se reduziria a um existente entre outros. Também não se pode compreender a existência como a soma ou conjunto daquilo que existe, pois nesse caso ela não teria nenhum atributo próprio senão aqueles que estão nos existentes ou aqueles que resultam das relações entre eles e, portanto, nada seria por si mesma. Para apreender a noção de existência você tem de fazer um esforço de imaginação para conceber a total inexistência do que quer que seja”. (...)
Olavo: Se nós falamos de criação, portanto nada existia. Então, vamos suprimir tudo.
“Suprima o cosmos, suprima a História, suprima todos os entes reais ou irreais, suprima até mesmo a consciência humana (a começar pela sua própria), e tente conceber o que sobra. É o nada? Sim, certamente o nada. Mas não o nada absoluto, porque sabemos que existe alguma coisa e, se algo existe, é porque é possível. Excluídos todos os existentes, sobra um nada, mas um nada cheio de possibilidades. Se você excluir mesmo essas possibilidades, terá declarado que tudo é impossível, mas você sabe que algo é possível, já que algo aconteceu. O nada que sobra quando suprimidos todos os existentes não é pois propriamente um nada, mas um feixe de possibilidades. Quais
possibilidades? Todas as que se realizaram e todas as que ainda podem se realizar. Isso é o que chamamos “existência”: a possibilidade de que os existentes existam. A possibilidade dos existentes não existe como eles existem: existe independentemente deles. (...)
Olavo: Se a possibilidade fosse coexistente com os entes, todos eles teriam que existir ao mesmo tempo, e nós sabemos que não é assim.
“A possibilidade não depende dos existentes – os existentes é que dependem dela. Mais ainda: a possibilidade transcende infinitamente os existentes, pois abrange também todas as relações possíveis entre eles. O conjunto das relações possíveis entre os existentes não pode ser deduzido da soma dos atributos de todos eles, pois há possibilidades acidentais que não derivam desses atributos”. (...)
Olavo: Ou seja, a possibilidade abrange não somente todos os entes possíveis, mas todas as possíveis relações entre eles, inclusive relações acidentais, que não decorrem da natureza e nem dos atributos deles.
“Para cada conjunto de atributos de um ente, há em volta um conjunto imensamente maior de acidentes possíveis, e estes, se são possíveis, fazem parte da possibilidade, estão contidos naquele “nada” que você encontrou ao suprimir mentalmente a totalidade do que existe.
A palavra “possibilidade” é usada, no dia a dia, apenas como medida de uma conjetura que fazemos sobre este ou aquele ente, sobre este ou aquele conjunto de entes, ou sobre este ou aquele fato. Mas uma coisa é a possibilidade considerada ao nível dos entes (...)
Olavo: Isto é, tomando-se entes já existentes. Por exemplo, se perguntamos: é possível um burro voar? Você está subentendendo que existe burro, que existe voo, portanto que existe a atmosfera, que existe espaço, que