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Corporalidade e desejo: Tudo sobre minha mãe e o gênero na margem (Corpos…
Corporalidade e desejo: Tudo sobre minha mãe e o gênero na margem
Introdução
Breve contextualização da temática do artigo trazido pelo personagem travesti, Agrado, do filme
Tudo sobre minha mãe
, do cineasta espanhol Pedro Almodóvar.
Conflito do filme:
Manuela (enfermeira) perde seu filho de 18 anos num acidente. Vai para Barcelona onde reencontra:
Agrado
- travesti e prostituta - foco de análise do artigo.
Irmã Rosa
- freira que faz trabalho com travestis. Se descobre portadora do HIV e grávida de um travesti.
Huma
, atriz de teatro de quem o filho é fã e que encena um drama amoroso com sua parceira de palco e amante, viciada em drogas.
Pai do filho
de Manuela é travesti.
Corpos ocultos x corporalidades públicas
Tudo o que tenho de verdadeiro são meus sentimentos e os litros de Silicone que me pesam toneladas.
Para ela mais é autêntica quanto mais se parece com o que sonhou para si mesma.
Elenca filmes clássicos que tratam do
tema do travestismo:
Paulo Marino
ressalta haver em comum é a preocupação em
ocultar os traços e as formas do corpo que poderiam delatá-lo como membro de outro sexo
Gaiola das loucas
(Mike Nichols, 1995)
Madame Doubtfire
(Chris Columbus, 1993)
Yentl
(Barbra Streisand, 1983)
Victor ou Vitória
(Blake Edwards, 1982)
Tootsie
(Sidney Pollack, 1982)
Meninos não choram
(de Kimberli Pierce, 1999)
História de uma jovem que se traveste de rapaz, anda com rapazes e namora outras jovens. Sua verdadeira identidade quando o corpo é descoberto e estuprada pelos dois amigos.
Tudo sobre minha mãe
não vai pela linha do ocultamento.
Segue a linha de filmes como
Priscila, a rainha do deserto
e
O ano das treze luas
, de Rainer Fassbinder.
Agrado, não busca o ocultamento, não faz de conta que é mulher.
Exibe seu corpo transformado, fabricado, não um corpo substantivo, objetificado.
A autenticidade desse corpo estaria no processo que o fabricou.
Seu corpo é corporificação de seu próprio desejo.
É travesti diferente das outras - vai da prostituição para o palco como tipo de experiência transgênero diferente das drag queens e afins.
Marcada pelo desejo de "aparecência", de evidência de uma corporalidade construída.
O travestismo de Agrado não tem um final de desvendamento porque não existe identidade oculta.
Rompendo a oposição entre o falso e o verdadeiro, também rompe com outra oposição essencialista: natureza e antinatureza.
Desejo como natureza
As transformações feitas no corpo e da fala sobre esse corpo faz com que Agrado apareça como sujeito.
Traídos pelo desejo
(Neil Jordan)
A autenticidade depositada no silicone cumpre a mesma função da parábola do escorpião e da rã.
Conta a história de um ex-militante do Exército Republicano Irlandês que se apaixona pela namorada de um soldado americano. - travesti.
A natureza incontornável não é natureza anatômica, mas aquela que diz respeito ao saber e ao desejo.
A natureza não está no corpo, mas no desejo, para Dil, ou no desejo inscrito no corpo, o silicone, para Agrado.
Agrado (e outros transformistas)
O corpo não é um território dado
a priori
, só existe enquanto experiência. É um espaço de reterritorialização desses sujeitos da margem.
O processo de transformação, de tornar-se outro, é o que dá corporalidade a esse desejo e ao sujeito desse desejo.
Sua originalidade está no seu silicone que expressa sua "verdadeira natureza".
O gênero nas margens
Repensar corpo e gênero a partir da experiência de margem -
transgênero
.
Tem revelado aspectos do gênero que ficaram relegados ou à construção teórica ou à perspectiva comparativa com culturas outras.
O caráter artificial e fabricado do gênero e das diferenças de gênero - a fabricação cultural, social e política.
Tem possibilitado uma reflexão sobre o conceito de corpo para além do anatômico
Propõe ir além do dualismo essencialista da diferença anatômica por meio do diálogo entre as
formas não canônicas do gênero
com
estudos antropológicos
sobre as
noções de corpo em outras culturas
.
Canaques
, na Melanésia (1920 e 1930), foram ensinados pelo missionário, que além de alma possuem um corpo.
Essa noção de um corpo, singular, único e delimitado para os canaques é o processo de individuação.
Nem todas as culturas têm um conceito para corpo, pois este é uma construção cultural e histórica.
Nas concepções hegemônicas das culturas modernas, o corpo é a nossa natureza, o fator ou o termo irredutível.
A irredutibilidade do corpo nos leva a pensar no sexo como objeto (pênis ou vagina).
A individualização do sujeito travesti se expressa na transfiguração desse desejo em corporalidade.
A parte mais visível dessa transformabilidade de gênero acontece no sentido masculino-feminino. O dualismo permanece ao menos no plano metafísico.
O fenômeno do transformismo lembra os estudos sobre o perspectivismo ameríndio, em que tudo potencialmente pode se transformar em tudo em torno da polaridade presa-predador
Nas sociedades ocidentais modernas, o masculino está no lugar do predador e o feminino no lugar da presa.
O masculino é o universal, o feminino o particular. O masculino é a ausência do gênero (o englobamento da diferença no sujeito universal); o feminino é o gênero (o termo que marca a diferença, onde a particularidade aparece).
O dualismo kaxinauá e de outros grupos pano não é essencialista, mas um dualismo topográfico numa posicionalidade contingencial sempre hierarquizada.