12º. (CP. 23) - TRANSMISSÃO DAS OBRIGAÇÕES

Conceito

O conceito de considerar os devedores e os credores substituíveis em suas pessoas, sem alterar a obrigação como relação jurídica, é um conceito moderno e contrário ao pensamento dos romanos.

Eles consideravam as relações obrigacionais como intransmissíveis (antiga ideia de responsabilidade pessoal e corpórea do devedor). Por isso a intransmissibilidade das obrigações era o princípio vigente.

Entretanto, as exigências do comércio forçaram a praxe a encontrar meios legais para atingir a transmissibilidade das obrigações entre vivos. Eram: a delegatio, a procuratio in rem suam e o sistema das actiones utiles, tendo este último, na prática, os mesmos resultados econômicos e jurídicos da cessão das obrigações na sua acepção moderna.

Delegatio

Conceito

As institutas de Gaio salientam que os modos de transferência dos direitos reais não se aplicam às obrigações.

Caso o credor desejasse que a prestação que lhe era devida passasse a ser devida a outrem, só poderia obter esse resultado por meio de novação da obrigação. Esta se verificava com nova estipulação (delegatio activa), cujo objeto era prestação idêntica à da obrigação originária, e que, por ordem do primitivo credor, era feita entre o devedor e o novo credor (chamado, na terminologia moderna, de cessionário).

Com a nova estipulação, cessavam os efeitos da obrigação originária, verificando-se, destarte, a transmissão do crédito. Operação semelhante servia também para transmitir a obrigação de um devedor a outro (delegatio passiva).

Inconvenientes

Eram sempre necessárias a anuência, a presença e a cooperação ativa das duas partes da obrigação originária. Isso é natural na transmissão do débito (porque ao credor importa saber quem seja seu devedor), mas não se justifica na delegatio activa, na cessão do crédito, pois ao devedor tanto faz saber quem seja o seu credor, desde que a obrigação não seja alterada.

Outro inconveniente era que a delegatio só se realizava pela stipulatio e que as eventuais garantias que acompanhavam a obrigação originária ficavam extintas, uma vez feita a delegatio.

Procuração em Causa Própria (Procuratio in rem suam)

Conceito

A praxe, buscando uma forma de transmissão das obrigações que melhor atendesse às exigências do comércio, encontrou-a no mandatum agendi, isto é, no mandato processual.

No processo formular era permitido ao autor fazer-se representar por um procurator. Este era um mandatário especial, incumbido de agir em juízo, no interesse do mandante.

Aproveitando esse instituto, o credor-cedente (assim o chama a terminologia moderna) encarregava, como mandante, o cessionário de representá-lo, como mandatário, no processo contra o devedor. Tal ato era um mandatum agendi. Este não transmitia por si mesmo a obrigação, sendo necessário para a transmissão que o mandante (credor-cedente), ao constituir o procurator, renunciasse à sua actio mandati directa, pela qual poderia exigir não só a execução, mas também a prestação de contas do mandato. O procurator ficava então senhor da obrigação, verificando-se destarte a transmissão dela. Esse mandatário se chamava procurator in rem suam, porque agia no seu próprio interesse e não do mandante.

Inconvenientes

O cessionário por este meio não adquiria o crédito, ele não podia agir contra o devedor em seu próprio nome, mas só naquele do cedente.

Vantagem

A vantagem sobre a delegatio consiste no fato de, na procuratio in rem suam, não ser necessária a anuência do devedor da obrigação cedida, e, ainda, na subsistência das garantias dessa obrigação.

Sistema das "Actiones Utiles"

Conceito

Foi introduzida, na época imperial, para remediar os inconvenientes da procuratio in rem suam, sobretudo para tornar o direito do cessionário independente do direito do cedente.

Conhecidas originariamente no processo formular do período republicano, eram chamadas também de actiones ficticiae, pois se baseavam numa ficção. Em nosso caso, a ficção era considerar o cessionário como legalmente sucedendo ao cedente no seu direito com base na transmissão do crédito havida por ato jurídico inter vivos, sucessão que perante o direito estrito não ocorria.

Utilizando-se desse meio processual, as ações que cabiam ao credor-cedente podiam ser intentadas também pelo credor-cessionário, qualquer que fosse a forma da cessão.

Contornando, desta maneira, as disposições rígidas do direito estrito, a jurisprudência e a praxe da época imperial estabeleceram as bases do instituto da cessão como o conhecemos modernamente.

Regras Gerais

Pode ser feita a título gratuito e a título oneroso. No primeiro caso o cedente é responsável apenas pela existência do crédito (verum nomen) cedido e não pela solvência do devedor (bonum nomen). Na cessão a título oneroso, o cedente é responsável por ambas as coisas.

O cessionário adquire o crédito nas mesmas condições e com as mesmas garantias que o acompanhavam antes da cessão. Entretanto, para evitar abusos, no período pós-clássico foi proibido ao cessionário cobrar do devedor mais do que pagara pela cessão do crédito. De outro lado, as defesas processuais do devedor contra a pessoa do cedente subsistem também contra o cessionário.